Quarta-feira, 10 de Dezembro de 2008

59- A iniciação dos rapazes

(continuação de 58- A iniciação das raparigas)

 

Voltando a Maio de 1973, e ao tempo em que o ambiente entre as NT e as populações eram de confiança e de descontracção, lembro-me:

 

Do momento em que fui convidado a participar na festa da iniciação dos rapazes, que com cerca de catorze anos vão para a “mukanda”, onde são submetidos à circuncisão e onde lhes são também ministrados todos os ensinamentos.


Durante alguns dias haverá uma enorme actividade que gira em redor do rapaz / aluno / iniciado, dos pais, do operador, do ajudante, do professor e a aldeia.
No final do serviço, quando o aluno sai, há sempre um pagamento obrigatório, geralmente feito em animais domésticos, bebidas, ou outros bens.


Tudo acontece num cercado redondo com uma única entrada que fica virada para a aldeia, a “tchifwa”. Lá dentro, existe uma pequena palhota destinada à mulher mais idosa da aldeia a quem compete a preparação das refeições para que os circuncidados não emagreçam, não adoeçam ou morram, (diziam que tudo podia correr mal se fossem preparadas por uma mulher de estado impuro, isto é que pudesse ter relações sexuais).
À frente da porta, é plantado, numa pequena cova, uma espécie de arbusto, terminado em forquilha, com duas pontas, uma mais alta que a outra, e a que dão o nome de “mwehe”.

 
Na véspera da entrada dos rapazes, logo que anoitece, todos os casais da aldeia e outros estranhos vão para dentro do cercado onde acendem varias fogueiras, junto das quais se sentam, dançam, gozam a vida, comem e bebem até mais não poder.
Quando se ouvem imensos sons ensurdecedores acompanhados por batuques, começa a dança da circuncisão, a “tchisela”, a noite propiciatória e licenciosa, como diziam. Era o início de todas as liberdades, onde todas as brincadeiras são permitidas.
Nesta noite, não há casais, não há adultério, apenas homens e mulheres. É a noite dos amantes, em que a todos é permitido divertirem-se com a mulher do próximo.
Para que não haja dúvidas, o chefe da aldeia informa todos que ninguém pode provocar desordens ou estragar a alegria dos outros.
Cada participante tem a liberdade de dançar, agarrar, apertar ou apalpar outro do sexo oposto desde que se sintam mutuamente atraídos. As relações sexuais consentidas, procuradas ou toleradas, nesta noite, são todas praticadas fora do cercado, e só, até ao nascer do dia, quando acaba a dança.


Logo que nasce o sol, o chefe da aldeia, acompanhado de todos, vai rezar aos espíritos dos seus antepassados para que tudo corra bem e livre os circuncidados de toda e qualquer doença, feitiço ou mal.


Depois, os operadores, os seus ajudantes e o “mukiche” (mascarado), vão abrir outra saída no cercado, no lado oposto à única existente, por onde vão sair a fim de procederem ao corte dos prepúcios.


Com os braços prendem-nos, e a cabeça é virada para o lado para não verem a operação, que é feita sem anestesia ou outros cuidados anti-inflamatórios.


Enquanto os iniciados do ano anterior, dançam e cantam, o “mukiche” guarda o local da operação, para evitar que as pessoas alheias profanem o recinto da circuncisão.

 

 

Depois de operados, completamente nus, ficam em fila virados para nascente com o pénis a sangrar (não podem olhar para poente e para o local onde foram operados).

Para acalmar a agitação, o medo e a dor dos iniciados, é lhes colocado, na cabeça, um pouco de argila branca bem molhada e para fazer parar o sangue, põem sobre o golpe, um pouco de pó proveniente de plantas.

 

Por fim, os iniciados dormem três noites ao ar livre junto de uma fogueira, e depois dentro de umas palhotas que construíram.


Ao romper do dia, sentam-se virados para o nascente, assistem ao nascer do Sol e pedem para que lhes dê fecundidade e potência sexual.

 

A partir da data da circuncisão, passam a ser considerados homens e adquirem um novo nome.

 

(a seguir - O tchimbanda)

 

publicado por Alto Chicapa às 13:37

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